22 de out. de 2010

Capítulo IX

- Não sei. Não posso dizer nada. Eu... Eu... Ainda amo a Cassandra Cacilda. Por mais irado que eu tenha ficado depois de tê-la visto dançando noite passada sobre a mesa, ela ainda mexe comigo. É algo que eu não consigo mudar - Clóvis estava prestes a chorar, as lágrimas brotavam em seus olhos, sua visão estava ficando turva de medo e ódio.
- Clóvis, não faça isso comigo. Por favor, em nome dos velhos tempos. Deixa-me tirar a dor que paira sobre seu coração jovem. Eu sei que você também quer porque você quer esquecer aquela bitch-boca-de-truta. E você sabe que amo-te e sou a única pessoa capaz de tirar isso de você - Sr. Smith estava implorando quase de joelhos para que Clóvis Constantino aceitasse seu amor novamente.

Diante disso, Clóvis Constantino levantou-se da cama, menos molenga e fracote, foi à cozinha e bebeu água. Seu corpo estava desidratando com as lágrimas que queriam cair de seus olhos e, também, suando o medo que sua mente - e coração - exercia sobre seus pensamentos em relação ao Sr. Smith. Este, por sua vez, seguia o rastro de Clóvis, para ver se não fugia de sua mira.

- Clóvis, já sabes se ainda me quer? Você também sabe que eu moveria o mundo para ficar com você, perto do seu calor, do seu abraço forte, do seu cheiro de macho alfa, dos seus lábios macios como a neblina de inverno - Sr. Smith estava tendo arrepios enquanto lembrava dos melhores momentos de sua vida multi-colorida.

Ao terminar de beber a água do copo, Clóvis Constantino deposita o mesmo na cuba da pia e vira-se para Sr. Smith, fixando-o com seus olhos.

- Sr. Smith, já disse que não sei! Até agora todo mundo me jogou contra a parede, e sempre chamaram-me de lagartixa. Agora está na minha vez de fazer isso - Clóvis Constantino bebeu confiança, em vez de um copo d'água. Espere-me aqui, já volto.

Sr. Smith ficou apreenssivo, com medo do que Clóvis poderia estar tramando, mas ficou no lugar indicado por seu pedaço de mau caminho. Passaram-se 10, 15, 20 minutos até que, de repente, Clóvis aparece todo emperequetado, cheiroso e deus grego.

- Quero levar-te a um lugar muito especial para mim, Sr. Smith - Clóvis Constantino puxou seu patrão pelo braço, pegando a chave do carro dele.

Eles foram andando sem destino, aparentemente. Clóvis Constantino dirigia sem medo, parecia mais que era o carro indo pelas ruas por conta própria. O silêncio mórbido e assustador que se fazia dentro do carro foi quebrado no momento em que Sr. Smith ligou o rádio na Blowing Heart, com a música Alejandro da Lady GaGa. "Eu estou com meu Alejandro, nem que seja só sentado ao seu lado", pensou Sr. Smith. Mas ele sabia que não poderia falar nada, Clóvis Constantino tornou-se imprevisível e perigoso, e era exatamente isso que Sr. Smith queria despertar nele.

- Vejo que ainda não mudou seu gosto musical. Ainda ouve Celine Dion e Laura Pausini?
- Não mais, as de agora são melhores. Gosto da GaGa e da Britney, elas são mais ousadas - Sr. Smith observou Clóvis pelo canto dos olhos.
- Vejo também que não mudou seus modos - Clóvis fitava a estrada semi escura, pois já era quase a hora do sol nascer.
- Não mudo porque eu sei que é disso que você gosta Clóvis. Desde a época do ensino médio, quanto nos tornamos mais chegados, que eu percebi sua tara por bundas e pernas firmes. Notei isso quando você tentou apertar minha panturrilha. E como se não bastasse, tentou mordê-la.
- Aquilo foi sem pensar. Quando me dei conta, vi que estava embaixo de sua cadeira e o pessoal ao redor ficou me olhando. Não esqueço-me disso - Clóvis ficou emcabulado.
- Sei.

Então o silêncio voltou, mas nem fazia mal. Eles já haviam chegado ao lugar de destino: um penhasco que dava conntra o mar e, ao fundo, o sol dava tons laranja-avermelhado ao mar. Aquilo encheu os olhos de Sr. Smith. Ficou encantado com tamanha beleza.

- Sabia que iria gostar. É um dos meus lugares favoritos. Venho aqui para relaxar e tirar as mágoas do coração.
- Você é sábio em suas escolhas Clóvis, por isso sempre gostei de você e de seu jeito.

Os dois saíram do carro, ainda com o rádio ligado, mas agora tocando Hush Hush das Pussycat Dolls. Sr. Smith encostou-se na dianteira do carro ainda maravilhado com a paisagem que se formava em seus olhos. Ele, por um momento, até esqueceu que amava Clóvis Constantino, mas este deu um gancho por trás em seu pescoço e jogou-o contra o capô do Camaro 2SS V8 e deu um beijo profundo em Sr. Smith. Clóvis não sabia o por quê de ter feito isso, mas sabia que tinha de fazê-lo.

3 de out. de 2010

Capítulo VIII

Enquanto Cassandra Cacilda dançava entre aqueles belos machos de coxas duras e torneadas, Clóvis Constantino corria e chorava. Por que aquela vadia faz isso com ele? Por que ela gosta tanto de mexer com seus sentimentos?

Clóvis Constantino sentia-se uma bichinha enrustida, mas a tristeza que ele sentia pesava muito em seu coração. Seu coração agora tão ferido, sangrando nas mãos daquela puta má. Mas ele não podia deixar-se vencer, não podia sucumbir aos desencantos do amor. Não, não agora que sua carreira começava a progredir. Entrou em seu Audi R8 5.2 FSI preto engolindo o soluço e retendo as lágrimas.

A tristeza deu lugar ao ódio. Então Clóvis Constantino agarrou o volante, deixando os nós de seus dedos brancos. Ligou o som na rádio local. A música que tocava o levou aos seus velhos e áureos, tempos esses em que nada o abalava: 

A música mexeu com ele. Sentia falta de emoção. Emoção positiva. Adrenalina. Sentindo-se um personagem de Velozes e Furiosos, pisou com toda a sua força no acelerador. A rua estava fria e deserta, e agora era invadida pelas luzes azuis de seu carro. Clóvis Constantino não sabia para onde ir, apenas deixava-se ser guiado pelas placas amarelas ao longo da estrada. Agora mais calmo, observava a paisagem passar rapidamente pelos vidros de seu carro quando, de repente, avista algo no meio da estrada. Um carro! Ele freia. Mas não a tempo de impedir que os carros choquem-se.

Seus olhos fechavam-se com sua vontade, ele sentia-se leve, caindo. O que parecia horas era, na verdade, segundos. Clóvis Constantino estava bem, já seu carro não. Abriu a porta deste e saiu. O cenário em que encontrou-se era assustador: árvores retorcidas e nuas tinham as raízes cobertas pela névoa densa e assustadoramente imóvel. Podia ouvir animais correndo sobre as folhas secas da floresta e pássaros pousando nos galhos secos para acompanhar sua desgraça. Viu-se sozinho e quase cagando em seu shortinho de ginástica.

Suava frio, sua pele estava branca e gelada e suas pupilas dilatadas. Queria sair dali. Então avistou uma sombra alta e corpulenta mexendo-se entre as árvores. Uma figura negra vindo em sua direção. Agachou-se com os braços sobre a cabeça, cerrando os olhos e torcendo para que tudo aquilo fosse uma visão.

- Você está bem? - perguntou a voz grave e rouca, estranhamente familiar. Está tudo bem, não vou te machucar.

Clóvis Constantino reuniu toda a sua coragem, desarmou-se de seus braços e encarou o homem à sua frente.

- Sr. Smith? O que faz aqui? - gritou Clóvis Constantino com uma voz fina e levemente abafada, misturando espanto e alívio.
- Estava apenas correndo, gosto deste lugar.
- Não está um pouco escuro para isso? E... com essa... roupa?

Clóvis Constantino, agora já de pé, olhava com estranheza as vestes de seu chefe: uma camisa amarelo-neon da Nike, um short de lycra branco e um tênis branco absurdamente feminino. Além de uma faixa rosa na cabeça. Ah, esse é o verdadeiro Smith, pensava Clóvis Constantino.

- Bem, você me conhece... - respondeu Sr. Smith em tom de deboche. Você sempre me conheceu muito bem...

As narinas de Clóvis Constantino foram invadidas por um cheiro que o fez sentir-se estranho. Era um cheiro com notas másculas cavalares. Aquele cheiro... Seus olhos reviraram-se, sua pele arrepiou-se, seu pensamentos começavam a dar espaço a uma onda de... Ei, Clóvis, está tudo bem? - perguntava novamente Sr. Smith, pousando sua mão negra, grande e pesada nos ombros do rapaz.

- Ah, desculpe-me... Acho que estou cansado, só isso.
- Aconteceu alguma coisa?
- Como assim? Acabei de bater meu carro, até há pouco estava prestes a parir um ornitorrinco de tanto medo! É claro que aconteceu alguma coisa!
- Acalme-se, Clóvis. Está tudo bem agora - e Sr. Smith agora falava com uma voz suave enquanto trazia o corpo de Clóvis Constantino de encontro ao seu. Está tudo bem agora...

Clóvis não queria, mas entregou-se. Um mar de emoções formava-se em seu peito, estava abatido demais para resistir. Queria um abraço, apenas isso. Seus últimos dias foram difíceis desde que conheceu Cassandra Cacilda. Cassandra Cacilda, aquela meretriz ordinária! Não queria mais pensar nela. Queria apenas dormir.

- Olha, Sr. Smith, respeito muito o senhor, mas isto está ficando estranho - disse Clóvis recobrando a lucidez emocional.
- Não tenha medo, pequeno. Quero apenas que você acalme-se. Você está tremendo, e está muito gelado! Precisa de roupas quentes... Mas vejo que seu carro não está em condições de uso. Permite-me oferecer uma carona até a sua casa?
- Vejo que o senhor tem razão. Tudo bem, aceito a carona. Só não entendo com seu carro pode ter saído inteiro desse acidente.
- Ora, Clóvis, você é um amador - Sr. Smith disse-lhe rindo e dirigindo-se ao carro. Agora entre, amanhã veremos o que fazer com a sua lata.

Clóvis Constantino nem ouviu as palavras de Sr. Smith, apenas acomodou-se no bando do carona esperando chegar logo em casa.

Alguns minutos passaram até o Sr. Smith parar o carro em frente ao prédio de Clóvis Constantino.

- Bem, acho que é aqui.
- Muito obrigado, Sr. Smith - Clóvis Constantino respondeu enquanto saia do carro. Meio cambaleante, ainda tremendo por causa do susto.
- Vejo que você ainda não está muito bem... Acompanhar-te-ei até seu apartamento.
- Não é preciso, Sr. Smith, estou bem!
- Não é o que parece, meu amigo. Suas pernas estão bambas, irá cair e rolar as escadas como uma salsicha branca.

Sr. Smith saiu do carro e pegou Clóvis Constantino pela cintura e segurando um de seus braços, ajudando-o a andar e ignorando suas recusas.

Foram assim até o elevador. Agora mais estável, Clóvis Constantino disse que já pode ir sozinho até seu apartamento.

- Claro que não! Você ainda não me parece bem, faço questão de certificar-me de que você chegará em casa inteiro!

O elevador subia e os dois, em silêncio, observavam a vista. Um bipe anunciou a chegada ao andar de Clóvis Constantino.

- Cadê suas chaves? Deixar-te-ei deitado, você não está conseguindo andar.

Clóvis Constantino estava tão cansado que nem se deu ao trabalho de relutar, apenas entregou-lhe as chaves e fechou os olhos esperando sentir os lençóis macios de sua cama. Pôde ouvir a porta ser aberta, as luzes de sua sala serem acesas e, finalmente, seu corpo ser deitado em sua confortável cama. Abriu os olhos e viu que o Sr. Smith o observava. Sentiu algo estranho. Não sabia muito bem o que era, mas era forte. Medo, talvez.

- Muito obrigado novamente, Sr. Smith. Devo-lhe alguns favores, não é? - foi o que Clóvis Constantino conseguiu dizer. Sua voz estava fraca, e ele sentiu então a tristeza voltando. Mesmo assim, sorriu para o homem encostado na parede.
- Claro que não, rapaz. É um prazer ajudar meus funcionários. A não ser, é claro, que você queira ser algo além disso... - respondeu com uma voz sensual o Sr. Smith, empinando o queixo e encarando-o com uma poker face.

O silêncio tomou o quarto.

- Sabe, Clóvis Constantino. Eu vinha há algum tempo tentado reencontrá-lo. Sinto sua falta, você não sabe o quanto. Sonhava todas as noites com você, esperando poder sentir seu cheiro outra vez. Oh, Clóvis Constantino, você não pode imaginar a dor que senti ao te ver ao lado daquela mocréia com boca de truta. E vejo que você também sente minha falta, posso ver em seu olhar, Clóvis Constantino... Diga que sente minha falta, Clóvis Constantino, diga!